RAZÕES DE VETO

 

PROJETO DE LEI Nº 277/22

 

OFÍCIO ATL SEI Nº 067436464

REF.: OFÍCIO SGP-23 N° 1171/2022

 

Senhor Presidente,

 

Por meio do Ofício acima referenciado, essa Presidência encaminhou à sanção cópia do Projeto de Lei nº 277/22, de autoria deste Executivo, aprovado em sessão de 29 de junho do corrente ano, que dispõe sobre as diretrizes orçamentárias para o exercício de 2023.

O texto vindo à sanção, contudo, não detém condições de ser sancionado em sua íntegra, sendo indeclinável a aposição de veto parcial, atingindo integralmente o inciso IV do art. 2º e o Anexo IV; o § 2º e incisos do art. 8º; o § 3º do art. 13; o art. 18; o inciso XII do art. 22; o art. 33 e parágrafos; os incisos IV e V do § 2° do art. 40; os incisos III e IV do § 2º e o § 5º do art. 49; o “caput” e os parágrafos do art. 50; o art. 51; o art. 52; o art. 54; o art. 55; o art. 56; o art. 57; o art. 59; o art. 60; o “caput” e incisos do art. 61 e o art. 62, na conformidade das razões a seguir explicitadas.

O inciso IV do art. 2º e o Anexo IV visam a ampliar o rol de despesas que não serão objeto de limitação de empenho. A pretensão acarretaria, contudo, o aumento da rigidez orçamentária, dificultando sobremaneira o cumprimento das metas e prioridades destacadas nos instrumentos de planejamento municipal e na própria Lei de Diretrizes Orçamentárias (doravante LDO). Tal medida não se afigura razoável pelo prejuízo que irá causar nas demais demandas de políticas públicas a serem implantadas no exercício de 2023.

O § 2º e incisos do art. 8º pretendem ampliar as metas e prioridades da Administração Municipal para o exercício de 2023 mediante o acréscimo de outras 72 (setenta e duas) ações prioritárias, além daquelas já consignadas no § 1º do mesmo artigo e no Anexo III do texto aprovado.

De início, impende asseverar que a referida inovação está em desacordo com o objeto da LDO, posto que pretende veicular comandos atinentes a ações governamentais específicas e concretas (algumas iniciativas ora em andamento pelo Executivo), o que retira a possibilidade da necessária avaliação político-administrativa quanto à implementação de novas medidas propostas.

De outra banda, conforme evidencia o conteúdo do aludido Anexo III, a previsão das metas e prioridades, além de discriminar cada ação governamental, deve igualmente conter, de forma individualizada, a estimativa dos respectivos valores financeiros, sob pena de inviabilidade de sua concretização por absoluta carência de recursos.

Com efeito, considerando que a LDO orienta a elaboração da Lei Orçamentária Anual, deve ela contemplar o dimensionamento financeiro de todas as metas e prioridades para o exercício ao qual se refere, daí a impropriedade orçamentária dos indigitados acréscimos.

O § 3º do art. 13, embora guarde pertinência com a LDO, mostra-se colidente com a Constituição Federal e a Constituição Bandeirante, especificamente por determinar a inclusão na Lei Orçamentária Anual de matérias não atinentes à fixação de despesas e estimativa de receitas.

O art. 18 estabelece que o valor orçado para a Secretaria Municipal de Cultura, no Projeto de Lei Orçamentária para 2023, não será menor que o valor orçado na Lei Orçamentária 2022, ou seja, estabelece um valor mínimo a ser destinado à Secretaria Municipal de Cultura. Dessa maneira, incorrer-se-ia em uma vinculação da receita de impostos, a qual se revela em desconformidade com a Magna Carta que, em seu artigo 167, inciso IV, veda expressamente, in verbis:

“A vinculação da receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os artigos 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino e para realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelos artigos 37, XXII; 198 e § 2º 212, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no artigo 165, § 8º, bem como o disposto no § 4º deste artigo”.

O inciso XII do art. 22, seguindo a mesma linha do § 3º do art. 13, determina a inclusão de matérias na Lei Orçamentária Anual que não dizem respeito à fixação de despesas e estimativa de receitas.

O art. 33 e parágrafos têm como objetivo a equiparação dos vencimentos dos funcionários das entidades educacionais conveniadas com os vencimentos dos funcionários de mesmo cargo/função da Rede Direta de atendimento da Secretaria Municipal da Educação, o que implica impor ao Município de São Paulo a obrigação de equiparar vencimentos de servidores/funcionários de regimes jurídicos diferentes, ou seja, procura-se impor a obrigação de se equiparar a remuneração de pessoas contratadas sob regimes jurídicos diferentes e com conjunto de responsabilidades e deveres diferentes.

Assim, o dispositivo esbarra nas vedações do art. 37, inciso XIII da Constituição e cria para o Município despesa obrigatória de caráter continuado sem apresentar estimativas de impacto, demonstração da origem de recursos e demonstração de que as despesas não irão afetar as metas de resultados. Vale ressaltar, ainda, que o dispositivo em pauta colide com as disposições do art. 113 do ADCT.

Os incisos IV e V do § 2° do art. 40 não podem prosperar, uma vez que têm como escopo a ampliação do rol de despesas que não serão objeto de limitação de empenho. A pretensão acarretaria, contudo, o aumento da rigidez orçamentária, dificultando sobremaneira o cumprimento das metas e prioridades destacadas nos instrumentos de planejamento municipal e na própria LDO, o que não se afigura razoável.

Adicionalmente, importa esclarecer que as ações de zeladoria das Subprefeituras já permeiam as ações previstas no Anexo III - Metas e Prioridades, consubstanciando redundância que em nada contribui para a operacionalização da norma.

De outro lado, os recursos advindos de convênios em vigor provêm da União ou do Estado, descabendo, assim, impor essa responsabilidade à Prefeitura.

Os incisos III e IV do § 2º e o § 5º do art. 49 vinculam receitas de impostos a determinadas despesas e a órgãos, o que colide com as disposições constitucionais insertas no art. 167, inciso IV, ou seja, valem para os referidos dispositivos as mesmas considerações efetuadas nas razões de veto do art. 18.

O “caput” e os parágrafos do art. 50 são ilegais, conforme já declarado pelo Supremo Tribunal Federal.

Em primeiro lugar, sob o prisma eminentemente jurídico-legal, tem-se que a pretendida disposição é incompatível com a natureza meramente autorizativa do orçamento, em perfeita sintonia com entendimento pelo Supremo Tribunal Federal, segundo o qual a previsão de despesa, em lei orçamentária, não gera direito subjetivo a ser assegurado por via judicial (AR 929, Relator Min. Rodrigues Alckmin, Tribunal Pleno, julgado em 25.02.76, RTJ Vol. 78, pág. 339).

No que se refere ao conteúdo do dispositivo ilegal, o legislador buscou tornar obrigatória, nas condições e formas que especifica, a execução orçamentária e financeira das emendas parlamentares. Ocorre que o tema não é pertinente à matéria a ser tratada pela LDO. Em outras palavras, as leis de diretrizes orçamentárias não gozam de força normativa suficiente a ensejar o nascimento de direitos subjetivos a eventuais interessados na concretização das políticas públicas nela enunciadas.

Nem poderia ser diferente, vez que o orçamento constitui plano de ação e planejamento estatal, cabendo ao administrador público, diante de situações concretas, sobretudo quando se deparar com escassez de recursos, dar prioridade a determinadas despesas, ajustando os gastos diante das necessidades ao longo do exercício. Por isso, não se afigura consentânea, no caso, a pretendida previsão de obrigatoriedade de execução orçamentária e financeira das aludidas emendas parlamentares.

Além disso, a existência de emendas de execução obrigatória, que extrapolam as vinculações legais e constitucionais já existentes, torna rígido o orçamento municipal em um momento de crise sanitária que exige dos gestores capacidade de ação e responsabilidade fiscal.

Dessa forma, as emendas parlamentares não devem se subtrair do disposto no art. 9º da Lei de Responsabilidade Fiscal, de observância compulsória pelos entes federativos, que expressamente prevê a obrigatoriedade de limitação de empenho e de movimentação financeira, por parte do Poder Executivo, em caso de risco de atingimento das metas de resultado fiscal.

O art. 51 incorre em uma vinculação da receita de impostos, que está em desacordo com a Constituição Federal. Assim, o dispositivo não pode prosperar sob os mesmos fundamentos elencados na análise do art. 18.

O art. 52 necessita ser vetado, pois constitui encargos de natureza administrativa e gerencial. Além disso, pode acarretar, a depender da quantidade de prestadores de serviço em cada código, violação ao sigilo fiscal previsto no art. 198 do Código Tributário Nacional.

A previsão, ainda, pode fragilizar interesses econômicos do Município, uma vez que os dados expostos podem configurar medida incentivadora da guerra fiscal por outros municípios.

Por outro lado, também enseja aumento de despesa pública, tratando de matéria estranha à LDO, de acordo com o artigo 165, § 2º da Constituição Federal e o artigo 4º da Lei Complementar nº 101/2000.

O art. 54 não deve ser incorporado ao ordenamento municipal pelas razões já expostas na análise do art. 18, ou seja, incorre em uma vinculação de receita de impostos que colide com as disposições constitucionais previstas no art. 167, IV.

Os arts. 55, 56 e 59 também não têm condições de prosperar pelos mesmos motivos já descritos na análise do art. 18, e pelas seguintes singularidades.

O art. 55 deve ser vetado pelo fato de impor a indexação de determinadas despesas do orçamento, o que retira o poder de negociação da Administração nos reajustes de contratos da Assistência Social e fere a isonomia em relação aos demais contratos administrativos.

O art. 56 também deve ser afastado em razão de se fixar um aumento substancial de despesa desacompanhado de um relatório que justifique a ampliação dos recursos, sem a indicação de qual política pública deverá ser reduzida para atender a determinação, o que pode acarretar prejuízo às políticas públicas aprovadas no Plano de Metas e no Plano Plurianual.

O art. 59 não reúne condições de ser mantido pelo fato de indexar o orçamento da COVISA a índice inflacionário, o que retira o poder de negociação da Administração nos reajustes de contratos da COVISA e fere a isonomia com relação aos demais Órgãos da Administração.

Por sua vez, o art. 57 deve ser vetado por ensejar aumento de despesa pública.

Por fim, a Lei de Responsabilidade Fiscal, precedentemente à aprovação da LDO, preconiza que se analise o impacto da renúncia de receita e se verifique se há imposição de alterações nas metas fiscais.

Na forma proposta no art. 60, no “caput” e incisos do art. 61 e no art. 62 deste Projeto de Lei, procura-se afastar essas exigências sob o subterfúgio de afirmar que os incentivos devem ser considerados na estimativa de receita e que não afetam as metas de resultados fiscais, ou seja, de forma mediata, afastam-se as exigências não só da Lei de Responsabilidade Fiscal, mas principalmente do art. 113 do ADCT da Constituição Federal.

Nessa esteira, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que “É inconstitucional lei estadual que concede benefício fiscal sem a prévia estimativa de impacto orçamentário e financeiro exigida pelo art. 113 do ADCT." (STF. ADI 6.303/RO. Relator Min. Roberto Barroso. Plenário, Sessão Virtual de 4.3.2022 a 11.3.2022).

Ante o exposto, evidenciada a motivação que me conduz a apor veto parcial ao texto vindo à sanção, vejo-me na contingência de vetar os seguintes dispositivos: o inciso IV do art. 2º e o Anexo IV; o § 2º e incisos do art. 8º; o § 3º do art. 13; o art. 18; o inciso XII do art. 22; o art. 33 e parágrafos; os incisos IV e V do § 2° do art. 40; os incisos III e IV do § 2º e o § 5º do art. 49; o “caput” e os parágrafos do art. 50; o art. 51; o art. 52; o art. 54; o art. 55; o art. 56; o art. 57; o art. 59; o art. 60; o “caput” e incisos do art. 61 e o art. 62.

Com fundamento no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo, devolvo o assunto ao reexame dessa Egrégia Câmara Municipal, renovando a Vossa Excelência os meus protestos de elevado apreço e consideração.

 

RICARDO NUNES, Prefeito

Ao Excelentíssimo Senhor

MILTON LEITE

Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

Publicado no DOC de 21/07/2022 – p. 14

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