Por: Renata Cafardo, O Estado de S.Paulo
SÃO PAULO - Em uma sala de 2.º ano do fundamental, decorada com um alfabeto colorido, jovens de 15 anos se esforçam para representar bem o Brasil. Antes de começar, coincidentemente, cantaram o Hino Nacional no pátio da escola – um procedimento de toda quarta-feira. Ninguém usa lápis e papel. Nos notebooks, há questões de Português, Matemática e Ciência. Crianças pequenas passam pelo corredor e o som alto de vozes e risadas invade a classe. Uma delas até tenta abrir a porta e é repreendida pela professora. Três horas depois, o tempo acaba para o grupo de 19 alunos da zona leste da capital. Poucos dias antes, eles descobriram que haviam sido selecionados para realizar a prova do Pisa, a maior avaliação de estudantes do mundo.
“Não sei o que é. Quem faz? A ONU?”, perguntava Enzo di Gesu Gesteira, de 15 anos, no dia anterior. A dúvida é compartilhada por todos os alunos da sala. O Pisa é realizado a cada três anos, desde o ano 2000, pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Participam da prova cerca de 70 países, entre membros da entidade e convidados, como é o caso do Brasil.
A prova de 2018 começou a ser aplicada no País no começo do mês e vai até o dia 30. Serão 17.507 participantes, todos nascidos em 2002, de 623 escolas, a maioria pública. O Estado acompanhou os exames na semana passada. Na capital, eles aconteceram no Colégio Penha de França, uma escola particular de classe média na Penha.
O Brasil participa desde a primeira edição e aparece sempre entre as dez últimas colocações dos rankings internacionais. Ao longo dos anos, a prova ganhou tamanha importância que seus resultados passaram a influenciar políticas públicas de educação no mundo todo. “Nunca ouvi falar”, completa o professor de História, da mesma escola, Caique Giardiello, de 26 anos. Como dá aulas para os selecionados, respondeu a um questionário do Pisa sobre didática e relação com os alunos.
A organização aqui é feita pelo Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (Inep), do Ministério da Educação. “Chegou um e-mail há um mês dizendo que tínhamos sido escolhidos. Não tinha a menor ideia do que era o Pisa e só perguntei se éramos obrigados a participar”, conta o secretário da escola, Antonio Carlos Cavallini Junior. Segundo o Inep, para a amostra são considerados dados como localização da escola e índice de desenvolvimento humano do município.
É comum haver anúncios do MEC em TV, rádio e jornais sobre o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), Prouni ou Financiamento Estudantil (Fies). Mas o Pisa não tem uma campanha nacional de divulgação desse porte. O Inep informa que enviou uma espécie de panfleto ilustrado sobre o exame para as escolas, mas não chegou ao Penha de França. Ao ser questionada pelo Estado, a presidente do Inep, Maria Inês Fini, concordou que deveria haver uma maior divulgação do exame. “O Brasil precisa entender melhor o que é”, diz. Maria Inês também afirma que não tem esperanças de o Brasil melhorar muito nos resultados, que serão divulgados só no fim de 2019. E acha que o grande ganho para o País é se acostumar com a tecnologia de fazer provas em computadores.
Orgulho. Depois que o Estado explicou mais sobre o Pisa, os estudantes selecionados se disseram ansiosos. “É um orgulho, mas também uma responsabilidade muito grande”, disse Isabela Jesus, de 15 anos. “Se a nota cair este ano, vou ficar meio para baixo porque eu vou achar que contribui pra isso”, completa a colega Letícia Prado, também de 15. Os adolescentes citaram Estados Unidos, Suécia, Noruega, Finlândia e Japão quando perguntados sobre quais países estariam entre os melhores do mundo. “Nesses lugares têm mais tecnologia, os alunos podem escolher que aulas querem fazer. Acho que eles gostam mais da escola”, acredita Giovanna Claudino, de 15 anos. Entre as nações citadas, apenas Finlândia, Japão e Noruega apareceram entre os dez primeiros colocados do Pisa em alguma das três áreas. Os Estados Unidos amargaram a 40.ª posição em Matemática na última edição.
Segundo o Inep, o Pisa 2018 tem 486 questões, mas elas são distribuídas aleatoriamente entre os alunos e não é possível saber quantas e quais perguntas cada jovem respondeu. A maioria é em forma de teste, mas há algumas dissertativas. A cada edição, o exame foca em uma das três áreas; esta é a vez da Leitura. Por isso, mais da metade das questões (245) foram relacionadas a Português e Literatura.
“Tinha calculadora e fórmulas no aplicativo do computador, a raiz quadrada e o teorema de Pitágoras já estavam lá”, contou Raphael Camboa, de 15 anos, depois da prova. Mesmo assim, Isabela queria ter podido fazer rascunhos em papel, pois acha que facilita o raciocínio. A reclamação foi compartilhada por alguns colegas, até que um dos aplicadores da prova informou que eles podiam, sim, ter feito contas a mão. Segundo os participantes, a informação não foi dada no início do exame. O Inep escolheu por pregão o Centro de Políticas Públicas e Avaliação em Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (Caed/UFJF) para aplicar o exame. Procurada, a assessoria de imprensa da UFJF informou que eles foram informados que podiam pedir papel para rascunho.
Alguns alunos disseram que não conseguiram fazer todas as questões por falta de tempo – mas como não eram numeradas, não era possível saber quantas faltaram. E todos foram unânimes em dizer que o Pisa é mais fácil que o Enem. “É lógica, interpretação de texto e alguns assuntos que aprendemos no fundamental, como fotossíntese”, explicou Izabelly Soares, de 15 anos. Eles gostaram que Star Wars e Machu Piccu, a cidade Inca no Peru, apareceram em textos. Lamentaram que nunca saberão como se saíram no Pisa – a nota é divulgada apenas por país. “No fim, tinha a pergunta: você se empenharia mais se a prova valesse nota na escola?”, indagou Giovanna. A resposta positiva veio quase em uníssono.
- Como é
Provas de Leitura, Matemática e Ciência são feitas a cada três anos. As de 2018 estão sendo aplicadas no País até dia 30 e os resultados sairão em 2019.
- Quem faz
Alunos de 15 anos de cerca de 70 países.
- Para que serve
Os resultados são divulgados por país. É considerada a prova mais importante do mundo e norteia políticas educacionais.
- Críticas
Apesar de um movimento grande de valorização das avaliações, há grupos que acreditam que países direcionam suas políticas só para se saírem bem no Pisa.
- Melhores colocações
Finlândia, Cingapura, Hong Kong, Estônia, Taiwan, Canadá, Japão estão sempre entre os dez melhores.
- Piores colocações
O Brasil está entre os dez piores, assim como Peru, República Dominicana, Kosovo, Macedônia, Argélia e Tunísia.
Texto original: educacao.estadao.com